quarta-feira, 9 de julho de 2008

O princípio do meu passado

Nasci na Primavera. Saudável e perfeitinha como todos os pais desejam. Quem partilhou os primeiros anos da minha vida diz que parecia uma boneca e que era vivaça, tão sociável que até estendia os braços aos homens do carro do lixo (nessa altura circulavam de dia). Também dizem que era "do contra" e para ilustrar essa ideia contam o episódio de quando um tio, por brincadeira, me ofereceu um copo de bagaço que eu logo recusei, para me testar proibiu-me de lhe mexer mas, sem cerimónias, mexi-lhe mesmo... é claro que o resultado foi amargo. A minha mãe diz que ainda hoje sou assim.
Fui amada e mimada, aos dois anos deram-me um irmão. O meu pai, carpinteiro, trabalhava de dia e estudava de noite e por isso só nos via quando estávamos a dormir. A minha mãe encarregava-se da casa e da nossa educação. De origens humildes, éramos também uma família humilde mas não nos faltava nada e os tempos eram de felicidade.

Entrei na escola aos sete anos e por isso até à faculdade fui sempre das mais velhas, talvez seja um dos motivos porque ainda hoje convivo com gente mais nova do que eu. Durante a instrução primária fui sempre a melhor aluna da classe, socializava bem com os colegas e era só na escola que convívia com outras crianças (o que viria a reflectir-se mais tarde). Esporádicamente tinha um ou dois amigos para brincar e os tempos livres eram ocupados a desenhar, a pintar e com trabalhos manuais. O desenho foi a maior companhia por muito tempo e ainda hoje estou ligada à criatividade artistíca através do design e de outras "manualidades". O futuro adivinhava-se risonho.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Passado

Quando encerramos um capítulo da nossa vida estamos simultâneamente a abrir outro, o fim é também o princípio. Se o capítulo que escrevemos não é o primeiro ele tem sempre subjacente todos os anteriores, são a sua base e o que dá consistência à história que se escreve. Ler apenas o último capítulo de uma história é descobrir os factos do seu final mas fica-se longe de a conhecer, compreender e apreciar, é assim como ouvir apenas o fim de uma anedota...
Quando a minha primeira vida acabou, e apesar do meu silêncio, disseram-me várias vezes "Tens que esquecer o passado" ou "O que passou, passou", talvez eu também o dissesse a alguém nas mesmas circunstâncias mas não quero ignorar os capítulos da minha história, tenho muito respeito pelo passado e não quero esquecê-lo, também não quero lembrá-lo com tristeza ou ressentimentos, eu apenas quero que o passado esteja q. b. no meu presente.
Tentar esquecer o passado é como varrer o lixo para baixo do tapete. Hoje, neste momento, eu sou todo o meu passado: o que vi e ouvi, as palavras que escutei e as que disse, todos os pensamentos e sentimentos que estas provocaram; sou as sensações que vivi, se compreendo a alegria e me compadeço com a dor é porque já as senti, se me afasto do lume é porque já me queimei, se sei a que sabem as lágrimas é porque já as provei! O passado é a bagagem que transportamos permanentemente, como se fosse mais uma camada da nossa pele, ele não se sente mas faz parte de nós.Nós somos o nosso passado e aquilo que fazemos com ele.